Erro
  • Erro ao carregar arquivo XML
  • http://www.blogdobepe.com.br/templates/sj_tech/templateDetails.xml
  • XML: failed to load "http://www.blogdobepe.com.br/templates/sj_tech/templateDetails.xml": No such file or directory

Lenio Streck defende decisão de Gilmar Mendes: “mais importante do que se pensa”

Dez 05, 2025

Por Miguel so Rosário, no Cafezinho                                                              

“Essa decisão do Gilmar é muito mais importante que se pensa”, afirmou o jurista Lenio Streck em entrevista ao UOL News nesta quarta-feira, 4 de dezembro de 2025. Para Streck, a grande virtude da medida é que ela “traz de volta a juridicidade para pedidos de impeachment, ao menos com o Supremo Tribunal”.

O jurista foi enfático ao avaliar os mais de 100 pedidos de impeachment protocolados contra ministros do STF nos últimos anos: “Algum dos 42 pedidos contra o Xandão ou algum dos 100 pedidos em geral contra todos os ministros tem algum grau de juridicidade ou era tudo questão política?”, questionou, para concluir de forma categórica: “Tudo era político”.

Streck defende que a banalização do impeachment transformou o instituto em uma ferramenta de pressão política, incompatível com a estabilidade exigida por um regime democrático. A incoerência do sistema anterior era gritante: para processar um ministro por um crime comum, a Constituição exige a atuação do Procurador-Geral da República; no entanto, para destituí-lo do cargo, qualquer cidadão poderia apresentar uma denúncia. “Como assim? Isso não é nem um pouco razoável”, criticou.

O jurista contextualizou a Lei nº 1.079, de 1950, como uma norma anacrônica, “feita do tempo em que se atava cachorro com linguiça”, quando o Ministério Público era um mero apêndice do Poder Executivo. A solução adotada por Gilmar Mendes, utilizando a técnica da “interpretação conforme a Constituição”, foi uma forma contemporânea de adaptação da velha legislação à nova ordem constitucional de 1988. Trata-se do que os constitucionalistas chamam de “filtragem constitucional”: reinterpretar leis antigas à luz dos valores da Constituição atual.

 Streck também criticou a omissão do Congresso Nacional em atualizar a legislação sobre o tema. O Parlamento, que poderia ter modernizado as regras do impeachment há décadas, “fica na dele porque não quer se incomodar”, afirmou. Para Streck, a decisão coloca “a coisa de volta nos trilhos”, impedindo que a política “fagocite o direito”. Para ele, “a decisão veio em boa hora”.

A decisão do ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal, determina que apenas a Procuradoria-Geral da República (PGR) tem legitimidade para iniciar processo de impeachment contra ministros do STF e que a sua abertura depende de um quórum qualificado de dois terços do Senado. A medida foi tomada no âmbito das ADPFs 1.259 e 1.260.

Fernando Neisser, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), defende a solidez jurídica da decisão. Ele explica que o STF, sob a Constituição de 1988, deixou de ser uma mera instância recursal para se tornar o árbitro dos conflitos entre os poderes. A exigência de um parecer técnico da PGR antes da abertura de um processo de impeachment funciona como um obstáculo necessário contra ações de cunho puramente político ou golpista.

O comentarista Reinaldo Azevedo também classifica a decisão como “impecável juridicamente”. Para Azevedo, o quórum de maioria simples conferia um “poder imperial” ao presidente do Senado, permitindo que apenas 21 parlamentares pudessem gerar constrangimento e pressão indevida sobre um ministro da Suprema Corte. A mudança para dois terços (54 senadores) traz coerência ao sistema.

 A própria decisão de Gilmar Mendes é fundamentada em uma análise histórica profunda sobre a evolução do Poder Judiciário no Brasil. O ministro contrasta o papel secundário do STF sob a Constituição de 1946 com sua posição central na arquitetura de 1988. A Lei de 1950 foi concebida para uma realidade em que os ministros eram vistos como “altos funcionários públicos”, e não como guardiões da Constituição com garantias específicas de vitaliciedade e inamovibilidade.

O ministro argumenta que um quórum baixo para a abertura do processo de impeachment fragiliza essas garantias, criando uma relação de dependência do Judiciário em relação ao Legislativo. Nas palavras de Gilmar Mendes, “o Poder Judiciário, nesse contexto, em especial o Supremo Tribunal Federal, manteria não uma relação de independência e harmonia, mas, sim, de dependência do Legislativo”.

Gilmar também recorre ao que os constitucionalistas chamam de “silêncio eloquente”: a Constituição de 1988 prevê expressamente que o Presidente da República, se denunciado, deve ser afastado automaticamente do cargo, mas não diz nada parecido sobre ministros do STF. Esse silêncio não é acidental — é proposital. O constituinte sabia que o Presidente tem um vice que pode assumir, mas um ministro do STF não tem substituto.

Um dos pilares da decisão é a vedação ao chamado “crime de hermenêutica”. Gilmar Mendes é enfático ao afirmar que não se pode responsabilizar um magistrado pelo mérito de suas decisões judiciais. “Hermenêutica” é a ciência da interpretação jurídica. O ministro argumenta que criminalizar a forma como um magistrado interpreta a Constituição seria criar um “crime de hermenêutica” — ou seja, transformar a divergência de opinião jurídica em crime.

 Na decisão, Gilmar escreve: “Não se mostra possível instaurar processo de impeachment contra membros do Poder Judiciário com base – direta ou indireta – no estrito mérito de suas decisões, na medida em que a divergência interpretativa se revela expressão legítima da autonomia judicial e da própria dinâmica constitucional”.

O ministro recorre à jurisprudência consolidada do próprio STF, que já decidiu que uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) não pode investigar atos jurisdicionais. Aqui, Gilmar aplica um princípio clássico da lógica jurídica, usado desde o Direito Romano: “a minori ad maius” (do menor ao maior). O raciocínio é simples: se o Congresso não pode fazer o menos, também não pode fazer o mais.

A decisão também se ampara no direito internacional, citando o caso Gutiérrez Navas y otros vs. Honduras, julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em 2023. Naquele caso, a Corte condenou Honduras por ter destituído quatro magistrados da Corte Suprema do país através do Congresso Nacional, sem notificação prévia, sem direito de defesa e sem qualquer motivação jurídica sólida.

A Corte Internacional foi clara: a independência do Judiciário é um pilar fundamental do devido processo legal e da democracia. Dois juízes da Corte escreveram em voto conjunto: “A possibilidade de afastar um juiz pela mera contraditoriedade de suas decisões em relação aos demais Poderes é, possivelmente, a mais grave afetação ao princípio da independência judicial”.

 

Gilmar Mendes também alertou para o uso do impeachment como instrumento de intimidação: “O impeachment infundado de Ministros da Suprema Corte se insere nesse contexto de enfraquecimento do Estado de Direito. Ao atacar a figura de um juiz da mais alta Corte do país, não se está apenas questionando a imparcialidade ou a conduta do magistrado, mas também minando a confiança pública nas próprias instituições que garantem a separação de poderes”.

Críticos podem argumentar que a decisão é um ato de autoproteção corporativa. No entanto, uma análise mais detida revela uma preocupação mais profunda com a estabilidade institucional. A medida cautelar de Gilmar Mendes não blinda os ministros do STF, mas qualifica o processo de responsabilização, exigindo um filtro técnico (PGR) e um apoio político robusto (2/3 do Senado).

Na minha análise, a decisão desmonta a estratégia abertamente golpista do bolsonarismo, que pretendia eleger senadores com o objetivo de derrubar ministros do STF e, assim, liberar o caminho para uma ruptura da ordem democrática no Brasil. Essa estratégia incluía aprovar anistia para os golpistas do 8 de janeiro, soltar os bandidos envolvidos nos ataques às instituições da república e intimidar os ministros para que deixassem de proteger a soberania popular.

A medida de Gilmar Mendes, portanto, representa um passo fundamental para a consolidação do Estado Democrático de Direito no Brasil e para a proteção das instituições contra tentativas de subversão da ordem constitucional.

Mídia

Deixe um comentário

Certifique-se de preencher os campos indicados com (*). Não é permitido código HTML.


Anti-spam: complete the task

Vídeos