O mais conveniente e fácil é se pôr um em lugar distante, de preferência do alto, e assistir tudo como se fosse um teatro de bonecos ingênuos. Julgar sem se colocar no lugar de juiz, criticar todas as "marionetes", mesmo não sendo quem as manipula.
Assistir como se estivesse de um camarote, mas sem ser aristocrata. Jogar a lata de cerveja do alto do camarote nas "marionetes" de todos os matizes, mas sem ser condescendente, apontar os dedos em gargalhadas aos flagelados, mas sem se imaginar no lugar de nenhum deles, pois eles são culpados por estarem lá.
Do alto se vê tudo, se tira todas as conclusões, e não faz parte de nenhuma solução, pois aqueles que oprimem e os que são oprimidos são parte do mesmo teatro, dirigidos por um sistema, apenas peças manipuladas ao sabor de poucos, idiotas úteis, polarizados.
Como diziam os colonizadores, deixem que esses animais se matem, e assim lucraram dividindo e conquistando. Mas, do alto, não se cai nessas armadilhas.
Do alto, no confortável camarote, dá para se agradar de pautas de ultradireita, mas sem ser. Dá para apoiar pautas de esquerda, mas sem ser, dá para criticar, julgar, rir, apontar dedos, mas seguro na postura de quem não concorda com nada, montado no corcel utópico que empina nas margens plácidas da distante miséria que assombra 80% do povo, mas sem sujar as botas.
E se meter o pezinho sem querer, passa no rapa pé na porta da igreja que nunca entrará, pois do alto do camarote, de tão alto que é, vê os deuses torturando seus filhos e come pipoca assistindo as chagas de cada um, mas culpando a eles mesmos, já que mergulham no ópio do divino em vez de fazerem o que têm que fazer.
E não importa, pois se não chegarem onde devem chegar, já planejado pelos que de cima assistem, seja lá onde é e como for, jamais sairão da lama que se encontram.
Então que morra, sofra, polarize, que caiam na aporia a eles reservada e brinquem nos labirintos a eles destinados por forças que nunca irão compreender.
Mas, no camarote, banquete de desdém, dedos em riste, gargalhadas a valer, brindes a cada contradição da plebe. O Olimpo despretensioso dos que não se misturam com as marionetes, pois essas não são capazes de enxergarem o mundo novo, já que Ícaro não pode voar tão baixo.
*Fábio Bezerra Cardoso é educador popular.