Foto: Ricardo Stuckert
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu nesta segunda-feira (18), no Palácio do Planalto, o chefe de Estado do Equador, Daniel Noboa, em visita oficial que resultou na assinatura de três memorandos de entendimento.
Os documentos abrangem cooperação no combate à fome e à pobreza, em ciência e tecnologia com ênfase em inteligência artificial, e em políticas públicas voltadas à agricultura familiar e ao desenvolvimento agropecuário sustentável.
Trata-se da primeira viagem de Noboa ao Brasil desde que assumiu o poder em 2023 e da primeira visita de um mandatário equatoriano ao país em quase 18 anos. Lula afirmou que o encontro simboliza o “recomeço da relação política, comercial, cultural e tecnológica” entre os dois países.
As falas dos presidentes e a lista de acordos revelam o esforço brasileiro de diversificação de parceiros diante do tarifaço imposto por Donald Trump — que elevou em 50% as taxas sobre produtos brasileiros e em 15% as exportações equatorianas.
Além da agenda bilateral, o Planalto prepara encontros com os presidentes da Nigéria e do Panamá ainda em agosto e busca abrir novos canais com países da Ásia.
“Para o Brasil, autonomia é sinônimo de diversificação de parcerias. Os laços com o Equador e com os demais vizinhos sul-americanos são prioridade para nós”, declarou Lula.
No discurso, Lula destacou a necessidade de cooperação amazônica e reafirmou o compromisso com a transição energética justa e a redução das emissões de gases de efeito estufa. Também anunciou a reabertura do escritório da Polícia Federal em Quito e maior integração no combate a ilícitos transnacionais.
“Não é preciso classificar organizações criminosas como terroristas nem violar a soberania alheia para combater o crime organizado. Só conseguiremos deter as redes criminosas que se espalharam pela América do Sul agindo juntos”, afirmou.
O presidente brasileiro voltou a criticar a ausência de regulação das big techs. “As redes digitais não devem ser terra sem lei, em que é possível atentar impunemente contra a democracia, incitar o ódio e a violência”, declarou.
No campo econômico, Lula sinalizou abertura gradual ao mercado para banana e camarão equatorianos, enquanto cobrou contrapartidas, como maior acesso da carne suína brasileira. Também defendeu atualizar o acordo Mercosul–Equador, em vigor há duas décadas, e celebrou a retomada em 2026 dos voos diretos São Paulo–Quito.
Em tom conciliador, Daniel Noboa agradeceu a recepção e destacou a necessidade de superar divisões ideológicas para avançar na integração regional. “As discussões ideológicas são página virada.”
“Precisamos procurar soluções para as pessoas”, disse. O equatoriano afirmou que segurança é o principal desafio de seu governo e citou crimes como narcotráfico, mineração ilegal, tráfico de pessoas e de órgãos. “É uma luta que não se pode lutar sozinho. Estamos aqui para estender a mão e trabalhar juntos”, afirmou.
Noboa também defendeu a integração logística entre Brasil e Equador, com ênfase na conexão rodoviária, ferroviária e hidroviária até os portos de Guayaquil e Manta.
“É importante vermos a América Latina como uma região única, e temos uma oportunidade de ouro para torná-la uma potência”, declarou, ao pedir mais comércio e intercâmbio de informações com o Brasil.
Filho de uma das famílias mais ricas do Equador e herdeiro de um império empresarial do setor de exportação de bananas, Daniel Noboa assumiu a Presidência em novembro de 2023 após eleição extraordinária convocada com a renúncia de Guillermo Lasso.
Foi reeleito em 2025 sob denúncias de fraude feitas pela candidata progressista Luisa González, que acusou o uso político do Conselho Nacional Eleitoral e do Tribunal Contencioso Eleitoral.
Com discurso liberal na economia e linha dura na segurança, Noboa governa em meio a um estado de exceção prorrogado sucessivas vezes, que levou as Forças Armadas às ruas.
Seu governo enfrenta recordes de violência — a taxa de homicídios chegou a 45 por 100 mil habitantes, e mais de 450 pessoas morreram em massacres em prisões desde 2021 — e uma grave crise energética, com apagões de até 14 horas diárias desde o fim de 2024, que já geraram perdas de US$ 1,5 bilhão.
Noboa também busca mudar a Constituição de 2008 para permitir novamente a instalação de bases militares estrangeiras, proibidas desde o governo Rafael Correa.
Além da política interna marcada por repressão e reformas liberais, Noboa tem se alinhado à Casa Branca e a Donald Trump. Reuniu-se com o republicano em Mar-a-Lago, de onde saiu com a promessa de retirar os equatorianos da lista de deportações.
A promessa não se cumpriu, e Trump ainda determinou sobretaxa de 15% aos produtos do país. Noboa, no entanto, manteve acenos, como a autorização para que os EUA utilizem as ilhas Galápagos e Manta como bases militares — uma medida que reverte a decisão de Correa, em 2009, de retirar os militares norte-americanos do país.